Rio - Uma nova área de lazer do Terceiro Comando Puro (T), ainda em construção, foi encontrada durante uma megaoperação da Polícia Civil no Complexo de Israel, na Zona Norte, nesta terça (10). No local, já havia duas piscinas, churrasqueira e materiais para obra. A região é dominada pelo traficante Álvaro Malaquias Santa Rosa, o Peixão. Na ação, quatro pessoas foram baleadas, incluindo um motorista e um ageiro de ônibus. Ao todo, 20 pessoas foram presas e os agentes apreenderam oito fuzis, duas pistolas, granadas e coquetéis molotov.
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Peixão é conhecido por possuir um 'resort' de luxo na comunidade Parada de Lucas. Descoberto em outubro do ano ado, o espaço era usado pelo traficante para reuniões dos bandidos do T e para fins recreativos da família dele. O imóvel contava com um lago artificial com carpas, piscina e uma enorme área de lazer. Em abril deste ano, uma outra operação também identificou uma academia usada por criminosos da região. No início do mês, a área alagada do 'resort' que ou por demolição começou a ser aterrada.
Durante a operação desta terça (10), os agentes pretendiam demolir mais duas construções irregulares utilizadas pelos traficantes como abrigo e pontos estratégicos de ataque — equipadas com seteiras — A medida deverá ser realizada conforme autorização judicial para desarticular a estrutura defensiva da facção.
Em vídeos divulgados na ação é possível ver ainda uma espécie de "bunker" encontrado na região. Na parede, havia ainda um buraco para armas de grosso calibre.
Veja o vídeo:
Vídeo mostra 'bunker' encontrado durante megaoperação no Complexo de Israel, na Zona Norte, na manhã desta terça-feira (10).
Segundo investigações da Delegacia de Repressão a Entorpecente (DRE), com apoio da Delegacia Antissequestro (DAS), da 22ª DP (Penha) e da 33ª DP (Realengo), a organização criminosa altamente estruturada e armada, sob a liderança de Peixão, atua nas comunidades de Vigário Geral, Parada de Lucas, Cidade Alta, Cinco Bocas e Pica-Pau.
A facção impõe seu domínio com o uso de barricadas, drones para monitoramento das forças de segurança, toque de recolher e monopólio de serviços públicos, além de promover intolerância religiosa.
"A Polícia Civil vem atuando em diversas frentes. Enfrentamos a expansão do Comando Vermelho na Zona Oeste, a ação das milícias, a contravenção, a máfia dos cigarros e a lavagem de dinheiro, com pedidos de bloqueios de mais de R$ 6 bilhões do crime organizado. A operação de hoje é mais uma prova disso, atacando o Terceiro Comando Puro em uma das regiões em que os traficantes subjugam a população. A Polícia Civil reafirma seu compromisso em combater todo tipo de criminalidade", afirmou o secretário de Estado de Polícia Civil, delegado Felipe Curi.
Sob o comando direto de Peixão, o T promove a intimidação sistemática de moradores, expulsão de rivais, ataques a agentes de segurança e ações coordenadas para impedir operações policiais. Foi identificado um grupo responsável pelo monitoramento de viaturas, queima de ônibus e organização de protestos simulados com o objetivo de obstruir o trabalho policial. Durante as investigações, os agentes apuraram ainda a existência de um núcleo especializado na tentativa de abate de aeronaves policiais, composto por criminosos com armamento pesado e treinamento específico.
Impactos da operação
Um intenso tiroteio durante a operação provocou o fechamento da Avenida Brasil e da Linha Amarela, e afetou a circulação de trens, ônibus e BRT na manhã desta terça-feira (10).
Ao todo, quatro ônibus, dois da empresa Evanil, um da Linave Transporte e outro da Transporte e Turismo Machado, das linhas 442B, 405T, 420T e 444L, foram alvejados na região. O coletivo da Linave Transporte foi atingido por diversos tiros, tendo vidros quebrados e lataria perfurada, mas nenhum ferido.
Segundo o Centro de Operações Rio, a Avenida Brasil ficou fechada nos dois sentidos, entre as comunidades da Cidade Alta e Vigário Geral, por cerca de 1h30, sendo liberada por volta das 7h30. Já na Linha Vermelha, os bloqueios seguiram nos dois sentidos até pouco antes das 8h.
Ainda pela manhã, um ônibus de fretamento foi incendiado na Avenida Governador Leonel de Moura Brizola, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Por conta disso, linhas da Transportes Flores também precisaram desviar o trajeto.
Segundo o Rio Ônibus, pelo menos 50 linhas municipais tiveram seus itinerários prejudicados. No entanto, com a liberação da Avenida Brasil e da Linha Vermelha, as linhas que am na região voltaram a circular mas estão com intervalos irregulares.
A ação impactou também o funcionamento de clínicas da família e escolas na região. De acordo com a Secretaria Municipal de Educação, nas localidades de Parada de Lucas e Vigário Geral, 10 unidades escolares foram fechadas. Na Cidade Alta, oito escolas suspenderam as aulas, enquanto nas comunidades Cinco Bocas e Pica-pau, outras três foram afetadas.
Além das escolas, a UFRJ determinou que não haja aplicação de provas e avaliações e não sejam cobradas presenças dos estudantes e servidores TAEs nesta terça (10). A medida se estende aos campi da Cidade Universitária, Praia Vermelha, Centro e Caxias. A mesma decisão foi tomada pela Unigranrio, que suspendeu as atividades na unidade de Duque de Caxias até as 13h.
Já a Secretaria Municipal de Saúde informou que quatro unidades de saúde que atendem à região, incluindo clínicas da família e centros municipais de saúde, foram impactadas. Destas, duas suspenderam completamente suas atividades, enquanto as outras duas interromperam as atividades externas realizadas no território, como as visitas domiciliares.
Quem é Peixão?
Considerado um dos criminosos mais procurados do Rio de Janeiro, Álvaro Malaquias Santa Rosa, o Peixão, Alvinho ou Aarão, de 38 anos, possui uma extensa ficha criminal e chama a atenção das autoridades por práticas incomuns no mundo do tráfico.
O líder do T está na mira das polícias Civil e Militar há pelo menos 12 anos, quando iniciou uma política de expansionismo violento para tomar territórios do Comando Vermelho (CV). Contra ele constam 7 mandados de prisão por homicídio, tortura, associação ao tráfico e ocultação de cadáver e pelo menos 20 inquéritos em aberto. Além disso, Peixão também ou a ser investigado por terrorismo.
Adepto de símbolos de Israel, como a Estrela de Davi, o traficante ou a ser conhecido por sua intolerância contra praticantes de religiões de matriz africana e costuma expulsar esses moradores de suas áreas de influência, além de determinar a invasão e depredação de centros religiosos. A religiosidade de Peixão é tamanha que ele se autointitula como Arão, o profeta de Deus, irmão de Moisés. O nome foi assumido também pela sua quadrilha que se autodenomina "Tropa do Arão". O próprio Complexo de Israel seria uma referência à terra prometida.
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